O cérebro tem tanto, mas tanto espaço para guardar as memórias que nenhum cientista sabe ao certo quanto espaço é esse. Há poucos anos, um grupo de investigadores do Salk Institute, na Califórnia, descobriu que a capacidade da memória será pelo menos 10 vezes superior ao que se julgava.

Ao reconstruírem um fragmento minúsculo do hipocampo, encontraram um número monstruoso de impulsos eletroquímicos que fazem a comunicação entre neurónios (padrões sinápticos) e que são responsáveis por armazenar a memória. Algo que andará à volta de 2,5 petabytes de dados, ou 1 milhão de gigabytes

Essas medidas não nos dão a mínima ideia das quantidades que representam. Mas, se convertermos tudo em livros, páginas de internet, horas de televisão ou anos de música, será qualquer coisa como 4,7 mil milhões de livros, 670 milhões websites, 300 anos de emissões televisivas ininterruptas ou 4,5 mil anos de música em formato Mp3. Dá para acreditar?

O que temos e o que usamos

 

 

 A memória não funciona sempre da mesma maneira, podendo a informação durar um segundo ou a vida inteira 

Pelos vistos, a capacidade para guardar informações é praticamente inesgotável, mas uma coisa é o espaço disponível e outra é a quantidade de memórias que se consegue colocar lá dentro. Aí a conversa já é outra.

Embora a lotação para armazenar as recordações seja quase ilimitada, o cérebro é incapaz de fixar a enorme quantidade de estímulos que recebe dos cinco sentidos. Há demasiada informação a circular a cada milésimo de segundo para se conseguir anotar tudo e com todos os detalhes.

É por isso que, em vez de se concentrar nas miudezas, o cérebro foca-se no aspeto geral. Por exemplo, quando um leão nos aparece à frente, os nossos sentidos transmitem ao cérebro uma enormidade de detalhes – a posição das orelhas, das patas e das garras em posição de ataque, o rugir, os dentes afiados, os músculos contraídos e por aí fora. A maioria desses dados, porém, não sai do subconsciente porque a única coisa que importa reter numa fração de segundo é que temos de fugir antes de a fera nos desfazer aos bocados.

E, por outro lado, a memória não é toda igual nem funciona sempre da mesma maneira. Temos uma memória a longo prazo – uma espécie de câmara frigorífica industrial que conserva as informações por muitos e muitos anos – e uma memória a curto prazo – que é como uma geleira de campismo, mantendo as informações por um período limitado de tempo, podendo depois serem esquecidas ou transferidas para a primeira câmara frigorífica.

Lembranças curtas e longas

 

  

 Exercitando a memória é possível torná-la mais elástica e duradoura, tal como um músculo do corpo 

E é por termos também uma memória a curto prazo que nos esquecemos muitas vezes de coisas. Cientistas acreditam que boa parte das informações enviadas para o cérebro pode durar menos de 30 segundos. Só conseguimos reter uma pequena quantidade – entre cinco e nove elementos, como letras, palavras, algarismos, entre outros. Basta aliás fazer um teste rápido para demonstrar como é limitada a nossa memória a curto prazo. Experimenta, por exemplo, memorizar durante dois minutos a lista de palavras que se segue:

Nove Troca Célula Anel Luxúria
Tomadas Lâmpadas Maçã Mesa Trouxa
Exército Banco Fogo Segurar Quente
Relógio Cavalo Cor Bebé Tranche
Secretária Agarrar Encontrar Bebedouro Rochedo

Agora, anota as palavras que consegues lembrar, mas não vale espreitar. Os cientistas estão convencidos de que não são mais do que meia dúzia delas, mas pode ser que consigas surpreendê-los. Até porque, tal como um músculo, é possível exercitar a memória, tornando-a não só mais elástica como duradoura. Esforço, treino e técnicas alcançam feitos extraordinários como aconteceu com o chinês Chao Lu que, em 2005, recitou sem se engasgar 67.980 dígitos do número Pi (π), durante 24 horas.

Ou como Dominic O’Brien, que entrou, em 2002, no livro de recordes do Guiness por enumerar uma sequência de 2808 cartas de 54 baralhos que visualizou uma única vez – errou oito vezes, quatro das quais corrigiu assim que o informaram da falha. Não é à toa que o britânico está proibido de entrar em qualquer casino, dado a vantagem gigantesca que teria sobre todos os outros jogadores.

Os truques dos atletas da memória

  

 O nosso cérebro transforma-se de cada vez que retém uma memória ou conclui uma aprendizagem 

 

Dominic ou Chao parecem ter superpoderes, mas o que eles fizeram qualquer um poderia fazer: treino e técnicas de memorização. O chinês, por exemplo, converteu pequenas séries de números em palavras que, dispostas numa determinada sequência, contam histórias. O britânico, por outro lado, usou uma técnica que já os gregos empregavam na Antiguidade e que ele chamou de método de viagem. Basta escolher um percurso familiar – entre a casa e a escola, por exemplo –, e ir traçado na mente várias paragens, cada qual ligada a um objeto.

Imaginando que temos uma lista com 5 tarefas para fazer: é só ir colocando cada uma delas no nosso caminho em lugares estratégicos: comprar pão está associado ao banco de jardim, dar um recado dos pais à professora está mentalmente fixado no vidrão à entrada da escola, devolver o livro da biblioteca na chaminé da churrasqueira e por aí em diante.

São algumas das muitas formas para memorizar e que não são tão diferentes das que usamos para aprender. Cada vez que ganhamos uma habilidade, como tocar um instrumento, uma língua estrangeira ou conhecimentos dos livros, algo acontece dentro da nossa cabeça. Não é só a memória e a comunicação entre os neurónios que se transformam, mas toda a estrutura do cérebro. Ninguém fica igual, depois de aprender, de experimentar ou de descobrir.

Fontes consultadas: Psicologiacop.blogspot | Estadão Seeker BBC Brasil
Ilustrações: Pixabay