Se pudéssemos ver as quantidades monstruosas de bactérias que vivem connosco, não conseguiríamos mais pregar o olho à noite. As estimativas mais recentes apontam para tantas quanto as células do nosso organismo. Feitas as contas, há cerca de 10 triliões de microrganismos e todos juntos formam o microbioma humano.

Felizmente, as bactérias são tão minúsculas que nem nos damos conta do gigante trabalho que fazem pela nossa saúde. Qualquer parte exterior ou interior do nosso corpo é um bom lugar para elas morarem, mas o trato digestivo é onde se sentem em casa. O percurso entre a boca e o final do intestino é a zona mais valorizada, uma espécie de bairro de luxo com moradias à beira da praia, onde todas sonham viver.

Mas lá por terem, regra geral, as mesmas preferências, não significa que sejam todas iguais. Cada comunidade tem a sua própria identidade. Os traços de personalidade da microbiota – colónias de bactérias que habitam o nosso corpo – estão muito dependentes da nossa alimentação ou dos restos de comida que chegam ao intestino e que são a sua principal fonte de energia. Daí as suas características variarem de pessoa para pessoa.

🍔 Se a carne é a base da tua dieta, a tua microbiota será muito diferente da de quem come saladas e legumes. 🥗

Mas, como são cada vez menos os humanos que gostam de sopas e verduras e cada vez mais os que se empanturram de pizzas, hambúrgueres, batatas fritas e outros alimentos processados, os microbiomas têm vindo a ficar todos muito parecidos.

O uso abusivo dos antibióticos também tem contribuído para acabar com a diversidade de espécies de bactérias e essa é mais uma razão para a Universidade Rutgers, nos Estados Unidos, querer construir na Noruega ou na Suíça – ainda não há uma decisão sobre o local – um celeiro para armazenar coleções de bactérias vindas de todo o mundo.

Um celeiro para guardar bactérias raras

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Arca de Noé microbiana é uma gigantesca operação para guardar amostras de bactérias antes que elas desapareçam.

O projeto, conhecido como Arca de Noé microbiana ou Microbiota Vault, destina-se a preservar a diversidade das bactérias, esperando-se que possam vir a ser úteis para proteger a saúde das futuras gerações. A operação envolve investigadores de todo o mundo, Portugal incluído, e ainda uma rede de colaboradores que irá estar mais concentrada em recolher amostras junto dos povos indígenas que, graças à sua alimentação rica em fibras e vegetais, demostraram ter as microbiotas mais diversificadas de todo o planeta.

E por que é importante preservar a diversidade destes microrganismos? Em primeiro lugar, quanto mais variada são as colónias de bactérias, mais chances tem o nosso corpo de combater as outras bactérias que invadem o nosso organismo, provocando doenças e infeções. A microbiota tem uma relação muito forte com o nosso metabolismo, ajudando o sistema imunitário, a digestão, estimulando a produção de hormonas ou de vasos sanguíneos ao redor do intestino, entre muitas outras funções.

Entre os inúmeros benefícios destaque-se também a capacidade delas para decompor a fibra dos vegetais, permitindo ao nosso organismo produzir vitaminas e compostos essenciais para assegurar uma nutrição saudável. Essas comunidades são, por isso, a primeira e a mais importante linha de defesa para o nosso sistema imunológico criar barreiras contra invasões de bactérias patogénicas (ou causadoras de doenças).

Uma floresta bem cuidada e robusta

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Quanto mais diversificadas forem as colónias de bactérias, mais preparadas estão para combater as doenças.

Karina Xavier, do Instituto Gulbenkian de Ciência, é uma das maiores especialistas mundiais em bactérias e costuma descrever a microbiota como uma grande e densa floresta. Quanto mais diversificada ela for, mais robusta se torna às invasões e maior será a sua capacidade para se recuperar após um ataque.

Tal como uma comunidade diversificada de bactérias é o melhor trunfo para nos defender de invasores, também uma floresta resiste e se regenera muito mais depressa a seguir um incêndio se tiver uma grande variedade de espécies – carvalhos, sobreiros, freixos ou alfarrobeiras – e não apenas eucaliptos e pinheiros.

Por todos os motivos, cuidem muito bem das florestas de bactérias que vivem convosco para que também elas estejam sempre em alerta e prontas para vos proteger. Em ciência, a cooperação entre dois ou mais organismos tem o nome de relação simbiótica – humanos e bactérias esforçam-se para oferecer o melhor de si à outra parte. O Bicho-que-Morde, que não é propriamente um cientista, chamaria a isso Amor 💕 Verdadeiro!

7 perguntas essenciais para fazer a uma bactéria

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Quem és tu?

Sou um organismo unicelular, significa que tenho uma única célula, mas é o que basta para desempenhar todas as funções necessárias à minha sobrevivência.

Em quantos grupos se dividem vocês?

Consoante as nossas formas básicas, podemos ser classificadas em cinco grupos: esférica (cocos), bastonetes (bacilos), espiral (espirila), vírgula (vibrios) ou saca-rolhas (espiroquetas).

Como é que se organizam?

Geralmente em cadeias ou em cachos (clusters), mas algumas gostam de viver em pares ou mesmo sozinhas.

Onde vivem?

Estamos em todos os habitats da Terra: solos, rochas, oceanos e até na neve ártica. Algumas de nós gostam de viver sobre ou dentro de outros organismos, como plantas, animais e humanos.

Por que devemos ter cuidado com os antibióticos?

Os antibióticos combatem as infeções bacterianas, mas o seu uso em excesso ou sem prescrição médica pode acelerar o desenvolvimento de bactérias multirresistentes e modificar — talvez irreversivelmente — as boas bactérias (conhecidas como comensais) que vivem no organismo humano. As experiências têm mostrado que os antibióticos interferem na composição da flora intestinal — quantidade e variedade — e que, mesmo depois de se parar a toma dos medicamentos, a microbiota não recupera totalmente. As superbactérias ou bactérias multirresistentes são estudadas desde o século 19 e o que se constatou é que, com o passar do tempo, elas se têm tornado cada vez mais resistentes aos antibióticos.

Quantas espécies de bactérias vivem no corpo humano?

Somos mais de 10 mil espécies diferentes de bactérias a viver no organismo humano e em lugares tão incríveis como a boca (700 espécies), a flora intestinal (1000 espécies) ou a pele (1000 espécies). Antes sequer de esboçares uma careta de nojo, lembra-te que não somos parasitas e que, sem nós, a tua vida seria muito complicada – a minha existência, diga-se de passagem, também não seria possível sem ti.

Vê em baixo alguns exemplos de boas bactérias.

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Quantas espécies nocivas de microrganismos (patogénicos) são conhecidas?

Existem cerca de 1400 espécies conhecidas de microrganismos capazes de provocar doenças aos humanos (incluindo vírus, bactérias, fungos, protozoários e helmintos). Embora possa parecer um grande número, os patógenos humanos representam menos de 1% do número total de espécies de microrganismos identificados no planeta.

Vê em baixo algumas das bactérias nocivas para a saúde humana.

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👨‍🔬 Se gostas de coscuvilhar sobre a vida dos microrganismos, lê também estes dois artigos:

Quantos vírus há na terra (além do coronavírus 2, claro)?

Quanto tempo demora uma ferida a cicatrizar?