Wangari Maathai voltou à aldeia da infância e encontrou tudo diferente. As florestas do Quénia desapareceram, deixando os habitantes sem campos férteis, água fresca ou lenha. Só o regresso das árvores poderia acabar com todos os problemas, pensou ela. E assim criou o Cinturão Verde, um movimento que começou com um punhado de sementinhas e um grupo de mulheres, mas que se alastrou para outros países de África com mais de 50 milhões de árvores plantadas.

Wangari Maathai tinha tudo para ser uma criança feliz. Tudo, tudo, não. Nas casas de Ihithe, a aldeia onde cresceu, não havia brinquedos, livros ou jogos, mas havia outros luxos como leopardos e elefantes a viver nas florestas, água fresca e campos férteis para cultivar mandioca, tomatinhos ou malaguetas nas hortas.

_ O suficiente para crianças e adultos serem felizes – pensou ela quase 30 anos depois ao regressar à província de Nyeri, no Quénia, para ajudar o marido a ser eleito no parlamento.

_ Onde está tudo isso? – Perguntou aos aldeões que, subiram com ela ao alto das montanhas para mostrar o que agora está diferente.

Nas colinas e nos socalcos, antes cobertos de cânfora e de bambu, há plantações de chá de perder de vista, mas só dão trabalho durante os meses da colheita, ficando os homens e as mulheres sem mais nada para fazer o resto do ano.

Nas antigas florestas, outrora carregadinhas de manguezais, palmeiras, teca ou sândalo, os troncos das árvores foram serrados e surgiram clareiras gigantes, que deixaram a terra ressequida. As hortas desapareceram e as mamãs têm agora de percorrer mais e mais quilómetros para encontrar água e alimentos.

Nessa noite, Wangari não dormiu, só pensava como os lugares da sua infância mudaram tanto.

_ Tenho de perceber porque já não há dias felizes nas minhas aldeias.

E ao procurar os porquês, logo descobriu o que fazer. Se os problemas surgiram quando as árvores começaram a desaparecer, então a solução é… plantar árvores. Simples. Afinal, elas dão tudo o que agora tanta falta faz: comida, abrigo e lenha.

Uma mão-cheia de sementes

Martin Rowe/Oregon State University

 Reflorestar as zonas áridas do Quénia começou com um grupo de meia dúzia de mulheres. 

Wangari foi a correr contar a ideia às líderes do Conselho Nacional das Mulheres do Quénia. Ficaram todas entusiasmadas, arregaçaram as mangas e puseram as mãos na terra. A 5 de Junho de 1977, Dia da Terra, sete árvores foram plantadas no Parque Kamukunji, no centro da cidade de Nairobi.

Uma para cada chefe de um grupo étnico, unindo todos à volta dos mesmos objetivos: acabar com a pobreza e recuperar as florestas perdidas do Quénia. E foi assim que nasceu o Movimento Cinturão Verde. Começou devagarinho, com meia dúzia de mulheres e uma mão-cheia de sementinhas. Era um grupo tão pequeno que alguns até fizeram troça da ideia.

_ Como é que um bando de aldeões, que nada percebe do assunto, pensa fazer renascer as florestas?

Elas não ligaram e continuaram a viajar pelas povoações à procura de mais cúmplices. A este grupo pequeno juntou-se um outro, igualmente pequeno, e mais um e mais um. Os grupinhos formaram um outro maior, que foi crescendo como uma praga boa que alastra a sua mancha verde para os cantos mais distantes do Quénia.

A oportunidade das mulheres

 O movimento Cinturão Verde deu trabalho a mais de 900 mil mulheres do continente africano. 

As sementinhas foram distribuídas gratuitamente pelas sete províncias do país. Por cada três árvores que sobrevivessem pelo menos três meses, as mulheres eram pagas com algumas moedas. Quanto mais plantassem, mais hipóteses tinham e mais moedas recebiam. E, como tal, todas elas semearam muito mais do precisavam para alimentar as famílias.

Com a ajuda das Nações Unidas, o conselho nacional construiu seis mil viveiros com milhares de plantinhas, transferidas depois para as zonas onde as árvores foram abatidas. O empenho dos aldeões foi tão grande, que milhares de postos de trabalho foram criados, principalmente para as mulheres.

Wangari achava que a vida delas é que precisava de mudar. Como não ganhavam dinheiro, não podiam tomar decisões importantes sobre as suas vidas e a dos filhos. Não é que tinha razão? Com o movimento Cinturão Verde, muitas delas deixaram de precisar dos maridos e chefes das aldeias.

Ao longo de mais de três décadas, o movimento Cinturão Verde promoveu a plantação de 30 milhões de árvores.

Não só no Quénia, mas em dezenas de outros países africanos, como Tanzânia, Uganda, Malawi, Lesoto, Etiópia ou Zimbabué, ajudando qualquer coisa como 900 mil mulheres segundo as contas das Nações Unidas.

O movimento Cinturão Verde ganhou tanto poder que Wangari conseguiu até fazer frente ao seu maior inimigo: Daniel arap Moi foi o presidente do Quénia entre 1978 e 2002. Um homem alto, magro e bem-falante, mas que não hesitava prender e castigar quem tinha ideias diferentes das dele. Mas não foi por isso que ela parou de lutar, ficando conhecida como «Mama Miti» que é como os quenianos chamam em suaíli «mãe das árvores».

Os monstros do parque

 Impedir que os arranha-céus ocupassem os lugares das árvores foi a primeira guerra de Wangari contra Moi. 

A primeira batalha dela contra Moi, em 1989, ficou para a História. O presidente queniano queria construir um arranha-céus de mais 200 milhões de euros com escritórios para os serviços do governo. E logo escolheu o Parque Uhuru, no centro de Nairobi, como localização para o novo empreendimento. A capital do Quénia já tinha tão poucas áreas verdes e ele ainda queria destruir mais algumas dezenas de hectares de espaços verdes só para ter um complexo de 60 andares com direito a uma estátua dele e tudo.

Assim que soube dos planos do presidente, Wangari juntou algumas centenas de companheiros e foram todos escorraçar o «monstro do parque». Dá para ter uma ideia de como Moi, pouco habituado a ser contrariado, ficou fulo da vida.

_ Quem é esta louca, cheia de insetos na cabeça, que acha que pode desafiar a minha autoridade?

Wangari tanto achava que conseguiu. A polícia acabou por expulsar os manifestantes do parque, mas as imagens do confronto apareceram em tantas televisões de tantos países, que as multinacionais cancelaram as propostas de investimento no projeto por medo de má publicidade.

Desde esse dia, Wangari passou a lutar também pela democracia, pelas mães que tinham os filhos presos só por contestarem o presidente e também pela união de todos os quenianos, qualquer que fosse a etnia. A oposição ao regime valeu-lhe algumas perseguições e passagens pela prisão, mas não chegou para ela desistir.

Tanto assim é que o poder de Moi esfumou-se há quase duas décadas, mas o trabalho de Wangari continua. E cresce todos os dias, mesmo depois de ela morrer, em setembro de 2011, doente de cancro.

O movimento Cinturão Verde já plantou até agora mais de 50 milhões de árvores no continente africano.

E adivinhem qual foi lugar que os quenianos escolheram para fazer o funeral dela? Não se está mesmo a ver? Por entre as ruas de cimento e betão, mais de 100 hectares de árvores, arbustos, lagos e pradarias do Parque Uhuru abrem caminho por entre os arranha-céus de Nairobi. Dentro dessa mancha verde, estão as cinzas do corpo de Wangari, que agora são também parte de todas as árvores que ela salvou.

Para veres a cronologia dos principais eventos na vida de Wangari, passa o cursor por cima das imagens.

ATENÇÃO: esta apresentação só resulta em pleno no portátil, tablet e desktop. No telemóvel, os textos podem aparecer cortados.

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Quanto vale uma árvore?

Fontes consultadas: The Guardiandw.comIndependent LensTaking RootThe Telegraph |

Site: greenbeltmovement.org

Créditos e fotos

Abertura: Mega Moura 

Martin Rowe, Oregon State University via Flickr 

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