Que raio de pergunta esta! O momento em que, na maternidade, anunciámos com um berreiro a nossa chegada será sempre motivo para festejar. Nem é preciso mais explicações. A data é mesmo especial. Mas, milhares de anos tiveram de passar até este ritual misturar superstições, religião, etiquetas sociais ou correntes filosóficas. Tudo isso é a festa que hoje fazemos sempre que o calendário marca o nosso aniversário.
Para conhecer a origem da festa de aniversário é preciso caminhar até à Antiguidade. Três ou quatro mil anos antes de Cristo nascer, os pagãos acreditavam em fantasmas perversos sempre à espreita, esperando pelo momento certo para os amaldiçoar. As grandes mudanças, como a passagem de mais um ano, eram particularmente perigosas. O que vale é que também havia espíritos bonzinhos – um para cada humano -, que os vigiavam e os protegiam desde o nascimento. O dia de anos, no entanto, só viria a ser assinalado com a invenção do calendário, que marcava os ciclos da lua e a mudança das estações.
O banquete do faraó
A primeira referência ao ritual surge no Velho Testamento, com um banquete para festejar o aniversário da coroação do faraó do Egito. Há muito poucas referências sobre esse episódio na Bíblia e, na verdade, não está relacionado com o nascimento. No início, as celebrações eram apenas destinadas às divindades, como é o caso da Ártemis. É graças a ela que o nosso aniversário é hoje doce e luminoso. Na Grécia Antiga, todos os anos se homenageava a deusa da caça com velas acesas para espantar os espíritos e bolos de mel redondos para simbolizar a lua.
A festa dos mortais
Os romanos, já no fim da Antiguidade, decidem que também têm os mesmos direitos, mas deixam as mulheres de fora. Os aniversários dos comuns mortais eram celebrados entre amigos e família com oferendas aos deuses, enquanto que os ilustres do império tinham direito a pompa e feriado. Festa de arromba só quando se fazia 50 anos, dia em que o aniversariante recebia um bolo de farinha, azeite, mel e queijo.
Os cristãos, entretanto, até achavam piada aos costumes dos romanos, mas não queriam dar o braço a torcer. As festas de aniversário, estando associadas ao paganismo, iam contra as crenças deles. Acabaram finalmente por ceder a partir do século IV, passando desde essa altura a festejar o nascimento de Jesus e, pouco depois, de cada filho de Deus na Terra.
A idade das trevas
A história desta festa nem sempre teve momentos altos, passou aliás por um longo e triste período em que ninguém lhe atribuiu grande valor. Na Idade Média, a maioria da população na Europa nem sequer sabia a sua data de nascimento. Cercados por fome, guerras e doenças, a vida não dava folga para grandes festejos. Além de que um indivíduo sozinho pouca importância tinha, fazendo parte ou da nobreza ou do clero ou então do povo a viver na miséria.
O humanismo renascentista, período que se segue, trouxe a crença de que o homem, tendo talento e vontade, poderia alcançar tudo o que desejasse. Entramos na era do individualismo, propícia para cada um sentir-se especial e ganhar uma súbita vontade de festejar o seu dia. Os primórdios das festas de aniversário estarão provavelmente nas grinaldas infantis – cerimónias que a nobreza e a burguesia alemã faziam no século 18 para apresentar os filhos à alta sociedade.
A festa dos meninos ricos
No século 19, a burguesia – ou seja, a classe média dessa altura – reproduziu estas festas e estendeu-as ao aniversário de todas as crianças e adultos. O bolo e as velas também regressaram, embora o costume já fosse bastante popular nos meios rurais. A tradição ganhou fôlego na Alemanha, mas foi num instante que chegou a toda a Europa.
Uma festa sem palmas nem cantoria não tem qualquer piada, mas desconhece-se a data exata em que entraram no aniversário. A canção mais famosa de todas – «Happy Birthday to You» – nem sequer foi escrita de propósito para a ocasião. Mildred e Patty Hill, duas irmãs e professoras americanas, são as autoras de «Good Morning to All» («Bom dia a todos»), composta em 1893 para os alunos cantarem antes de entrarem na escola.
Parabéns na Broadway
A cantiga, não se sabe bem como, saiu mais tarde do livro «Celebrations Songs», de Robert Coleman, e foi parar, em 1933, a um musical da Broadway já com o título de «Happy Birthday to You». A partir daí, a melodia foi mais rápida do que o som, atravessando o planeta e sendo hoje cantada em mais de 30 línguas.
O sucesso foi também a sua desgraça, já que a editora americana Warner Chappell Music adquiriu os seus direitos, não hesitando em multar de cada vez que a música surgia num filme ou era cantada num restaurante. Ao fim de oito décadas, e depois de faturar mais de 1,8 milhões de euros/ano, o Tribunal Federal de Los Angeles decidiu, em setembro de 2015, que a música é do domínio público.
A festa da lusofonia
Indiferente às guerras judiciais nos Estados Unidos, a versão portuguesa é popular nas festas de aniversário desde a década de 1940. Quem escreveu a letra foi Bertha Celeste Homem de Mello, farmacêutica, poeta e professora brasileira. Não foi sem mais nem menos que o «Parabéns a Você» se tornou conhecido em todos os países lusófonos. Foi preciso um concurso nacional no Brasil, lançado pela Rádio Tupi, em 1942, com mais de cinco mil participantes, para se eleger a melhor letra: «🎈Parabéns a você / Nesta data querida🎁 / Muitas felicidades🤸♀️ / Muitos anos de vida.💝»
Agora, sim, está completa a história da festa de aniversário. Há por aí alguém a fazer anos hoje? Há certamente. Por cada segundo que passa, três recém-nascidos desatam num berreiro, anunciando que estão prontos para começar a viver. Então, PARABÉNS a quem hoje faz anos!
Sete festas diferentes da nossa
México
Bolo e velas não são as principais estrelas das festas de aniversário mexicanas. Esse lugar está reservado à Pinhata – geralmente um burrinho de papel colorido, recheado de doces e serpentinas – que deve ser pendurado a uma altura de dois metros. O aniversariante deverá estar de olhos vendados e usar uma vara para açoitar o pobre animal até ele rebentar numa explosão de guloseimas e confetti.
China
Os chineses seguem o calendário lunar. A contagem dos anos é, por isso, muito diferente da do Ocidente. O tempo começa a contar a partir do instante da gestação. O primeiro aniversário (e o mais importante) é comemorado quando o bebé completa um mês de vida.
Israel
Com a maioria da população a seguir o judaísmo, o aniversário mais importante acontece quando as raparigas completam 12 e os rapazes 13 anos, momento em que já são considerados crescidos para assumir responsabilidades na comunidade religiosa. Essa passagem é assinalada com o Bar/Bat Mitzvah que significa filho/filha do Mandamento. Trata-se de uma festa, mas também de um ritual – Mazal Tov – para felicitar e desejar boa sorte aos aniversariantes.
Canadá
Besuntar o nariz do aniversariante com manteiga ou margarina é o costume nas festas canadianas para dar sorte.
Rússia/Sérvia/Bulgária/Grécia
As raparigas batizadas com nomes de santas ganham duas festas por ano – uma pelo dia que nasceram e outra pela data de nascimento da santa da qual receberam o nome.
Tailândia
Em vez de festa e prendas, o aniversariante passa o dia a oferecer alimentos aos monges que passam na rua.
Dinamarca
É muito fácil saber quando alguém faz anos na Dinamarca. Basta reparar se a bandeira do país está hasteada à porta de casa. As bandeirolas estão também por todo lado, na mesa, espetada nos bolos, ou pendurada na decoração.