Prepara-te: o número é impressionante. Mas mais alucinante ainda é a viagem dos nossos pensamentos pelos circuitos do cérebro até tomarmos uma decisão. Queres saber como são fabricados e se tornam conscientes? Vamos lá então! 😏

Se partirmos do pressuposto de que pensamento é tudo o que vem à cabeça – desde o raciocínio mais complicado ao impulso que nos leva a comer, tomar banho ou a tremer de medo – então, os números podem ir dos 60 mil a 70 mil por dia. Esse é o cálculo estimado pelos investigadores do Laboratório de Neuroimagem, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. As contas feitas aos pensamentos incluem também as horas em que o cérebro, mesmo durante o sono, continua a pensar.

A nossa mente solta um pensamento a cada 0,9257 segundos.

A esmagadora maioria dura menos de um milésimo de segundo e nem sequer temos consciência deles. Para evitar que a cabeça ande à roda todo o dia, a mente trata de filtrar os pensamentos, mantendo somente os importantes.

Mas, neste capítulo, há muitas perguntas ainda sem respostas. Boa parte dos neurocientistas nem concordaria com essas contas dos investigadores americanos. É que não há ainda um consenso sobre o que é o pensamento e como é ele criado. Infelizmente (ou felizmente), não é possível abrir a cabeça para ver o frenesim a acontecer lá dentro.

O que sabemos é que sem os neurónios a interagir entre eles, os pensamentos não existem. Essa rede neuronal é a base de tudo – desde aquilo que nos leva a agir até ao que fica secretamente guardado connosco.

O córtex (conhecido também como massa cinzenta) tem os papéis principais do pensamento. É nesse canto do cérebro que ele é fabricado e se torna consciente, influenciando os comportamentos, a forma como aprendemos, como raciocinamos, como usamos a memória, a linguagem, entre outras funções.

Tudo e mais um par de botas

Jonny Goldstein | CC BY-SA 2.0

 Quem controla os teus pensamentos? Sim, às vezes és tu, mas outras vezes, é a tua mente que está no comando. 

É tão abstrato o conceito de pensamento, que lá dentro cabe tudo: decisões a tomar sobre o que é melhor para nós, opiniões sobre tudo e qualquer coisa, processos mentais desencadeados quando procuramos respostas, receios que nos levam a não agir, ousadias que nos fazem arriscar ou o simples ato de sonhar acordado.

Podemos alternar entre vários tipos de pensamento. Podemos também ter um pensamento de cada vez. Ou muitos em simultâneo que nos ajudam a fazer várias tarefas ao mesmo tempo e a resolver problemas bicudos.

Muitas vezes, nem temos controlo sobre os pensamentos. É tão fácil isso acontecer quando deixamos a mente a divagar à procura do seu próprio rumo. Ou quando nos lembramos, por exemplo, que saímos de casa sem apagar a luz.

E também quando algo não sai da cabeça – uma música, uma irritação, uma tristeza, uma alegria ou um nervoso miudinho antes de um grande dia. Noutras alturas, somos nós que guiamos a nossa mente. Quantas vezes planeamos o dia na cabeça ainda antes de sair de casa? Chama-se a isso ações mentais, algo que fazemos o tempo todo sem precisar de mexer um dedo.

Veloz como o pensamento

Jonny Goldstein | CC BY-SA 2.0

 Se achas que o presente é o que estás a viver, fica a saber que tudo o que vês, sentes ou ouves tem um atraso de meio segundo. 

Na cabeça, tudo acontece muito rápido. Não precisamos de apanhar o autocarro nem de pedalar na bicicleta para chegar a qualquer lado. E, ainda assim, a velocidade é insuficiente para acompanhar o ritmo que acelera lá fora.

Os pensamentos, por mais simples que sejam, levam tempo até ficarem perfeitinhos na mente. São cerca de 500 milissegundos para processar os impulsos do mundo exterior. É só meio segundo, parece coisa pouca, mas é o que basta para o «presente» que julgamos ver diante dos olhos já ser, afinal, o «passado».

Parece confuso? É bastante, mas o cérebro encarrega-se de costurar as diferentes velocidades dos nossos sentidos para criar a ilusão de que estamos sempre em cima do acontecimento. A mente é um bocadinho manipuladora, mas é tudo por uma boa causa. Interpretar o mundo, elaborar hipóteses sobre como reagir, o que fazer e não fazer é tarefa complexa e lenta.

O circuito de emergência

Jinho Jung | CC BY-SA 2.0

 Em caso de extrema necessidade, o cérebro é mais veloz do que um relâmpago a tomar uma decisão. 

A não ser que…do nada, um leão atravesse o nosso caminho. Nesse caso, esqueçam as decisões sábias e ponderadas. O cérebro ativa o circuito de emergências. O reflexo é também o que nos faz saltar perante um estrondo, um grito ou um movimento inesperado. O ouvido é que dá o alarme, acionando um mecanismo muito simples com apenas três neurónios a conectarem-se à medula espinal e ao tronco cerebral.

Em 5 milissegundos, centenas de músculos são convocados para uma reação de autodefesa.

É o tempo que nos leva a ser mais rápidos do que um relâmpago.

Até parece um superpoder tirado das histórias de BD, mas, no fundo, não é nada de especial para o cérebro, que faz isso todos dias quando chutamos uma bola, agarramos um copo que se desequilibra da mesa ou desconfiamos de um olhar suspeito que alguém nos lançou. São circuitos automáticos, nada têm a ver com decisões conscientes, mas dos quais dependemos para sobreviver.

Os 4 circuitos da ponderação

Jonny Goldstein | CC BY-SA 2.0

 As decisões implicam um grande trabalho de planeamento do cérebro antes de qualquer palavra, gesto ou ação. 

Tudo se complica nas grandes decisões a tomar. A cabeça, nesses casos, ganha juízo e ativa não um, mas quatro circuitos. Um para a perceção, que capta os estímulos exteriores. Outro para a compreensão, que analisa esses estímulos. Mais um para decidir qual a resposta adequada. E o último para meter mãos à obra. Cada uma destas trajetórias é governada por partes distintas do cérebro. Caso contrário, se todas as informações fossem processadas no mesmo centro, era um engarrafamento brutal.

O cérebro, para evitar as horas de ponta, organizou tudo para que cada função tenha uma estrada para percorrer e uma casa para pernoitar.  Ao todo, são 52 áreas chamadas de Broadmann, em homenagem a Korbinian Broadmann, o neurologista alemão que mapeou o córtex e numerou diferentes secções para a linguagem, a visão, a audição, entre muitas outras faculdades humanas.

E agora é que a coisa se complica mesmo. Mas vamos lá simplificar o córtex em três grandes áreas – existem as secundárias, onde tudo é minuciosamente planeado pelo córtex pré-motor, e as primárias, que só têm de seguir as instruções previamente preparadas e pôr os músculos a trabalhar. É nesta fase que as áreas de associação entram em campo, para ligar as zonas sensoriais às motoras e converter os estímulos em palavras, gestos e ações.

Há, portanto, muita ponderação a acontecer dentro do cérebro antes de uma decisão saltar cá para fora. É bom lembrar isso sempre que estiveres num grande dilema. «Como ou não como esta enorme fatia de bolo coberta de morangos e chantilly, antes do almoço?». Se estás a pensar que é muito difícil não ceder ao que é mais fácil, é porque ainda não conhecias o poder da tua mente. Mas, agora que já sabes, comias ou não comias?

Antes de ires embora, dá uma olhadela também neste artigo: Quantos malabarismos é o cérebro capaz de fazer?

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